
O Novo Rádio – Novas Plataformas, Novas Abordagens.
O Rádio, gigante da comunicação, nunca esteve ultrapassado — ele apenas muda de forma, cresce e continua presente em todas as inovações, só que raramente lhe dão o devido crédito. […]
Ricardo Fadul 27 de fevereiro de 2025
Durante grande parte do século XX, os veículos de comunicação foram moldados por interesses comerciais e políticos. Rádio e TV, sob concessões públicas limitadas, eram controlados por grupos que ditavam a narrativa, filtravam as vozes e construíam um imaginário social muitas vezes alienante. A comunicação de massa, pensada para atingir o maior número possível de ouvintes e telespectadores, priorizou fórmulas simplificadas, reforçando estereótipos e promovendo um conteúdo popularesco que, muitas vezes, servia mais à manutenção do status quo do que à democratização do conhecimento.
A Escola de Frankfurt, com teóricos como Theodor Adorno e Max Horkheimer, já alertava para o perigo da indústria cultural, que reduzia a arte a um produto comercial, esvaziado de criticidade e voltado para o entretenimento passivo. Adorno, em suas análises sobre música popular, demonstrava como a repetição incessante de padrões melódicos e líricos anestesiava a capacidade de reflexão do público. Walter Benjamin, por outro lado, em A Obra de Arte na Era de Sua Reprodutibilidade Técnica, enxergava um potencial revolucionário nas novas mídias, caso fossem apropriadas para além do circuito tradicional da mercantilização. O rádio, para ele, poderia ser um espaço de interação e construção de consciência coletiva – mas, na prática, foi largamente utilizado para reforçar ideologias dominantes.
Esse modelo de comunicação, centrado na passividade do público, teve consequências profundas. Durante o século XX, regimes totalitários utilizaram o rádio como uma ferramenta poderosa para propagar discursos de ódio, manipular massas e justificar guerras. A propaganda nazista de Goebbels e os discursos inflamados de ditadores latino-americanos são exemplos claros de como um veículo de comunicação pode moldar percepções e definir narrativas que, muitas vezes, resultam em perseguições e exclusões em larga escala.
Mas sempre houve resistência. Nos bastidores dessa comunicação controlada, cresceram as mídias marginais, espaços alternativos onde a expressão artística e política encontrava vazão. Dos fanzines mal impressos, passando pelas rádios piratas, até os coletivos de produção audiovisual independentes, esses movimentos foram fundamentais para contestar a ordem vigente e dar voz a quem nunca teve espaço nos veículos tradicionais. Os rappers das periferias, os poetas das ruas, os radialistas clandestinos, os cineastas independentes – todos eles fizeram parte de uma luta contínua por representatividade e diversidade na comunicação.
E então veio a revolução digital. O que antes estava restrito a espaços clandestinos, hoje encontra na convergência das mídias uma oportunidade inédita de expressão global. Podcasts independentes tomam o lugar dos velhos programas de rádio; canais no YouTube desmontam narrativas dominantes; plataformas de streaming dão visibilidade a artistas antes ignorados pelo mainstream. Pela primeira vez, a comunicação não precisa passar pelo crivo de um grande grupo midiático para atingir milhões de pessoas.
Chris Anderson, em The Long Tail, explica essa transição de maneira clara: antes, apenas os grandes sucessos – os “hits” – tinham espaço na mídia tradicional, enquanto todo o restante da produção cultural permanecia invisível. A limitação dos veículos e a necessidade de alcançar grandes audiências tornavam impossível a disseminação de conteúdos de nicho. Mas, com a internet e a digitalização da comunicação, essa lógica se inverteu. Agora, conteúdos antes considerados “irrelevantes” ou “alternativos” podem encontrar seu público, pois o custo de distribuição e a barreira de entrada foram drasticamente reduzidos.
Essa descentralização não apenas transformou a forma como consumimos mídia, mas também abriu portas para criadores independentes. No livro Makers, Anderson mostra como a cultura do “faça você mesmo”, impulsionada pelas novas tecnologias, empodera indivíduos a criar, distribuir e monetizar seus próprios conteúdos. E em Free, ele reforça que o modelo tradicional de precificação da informação está sendo desafiado por um ambiente onde a gratuidade é uma estratégia viável e poderosa para alcançar audiências.
Pierre Lévy nos ensinou que a inteligência coletiva nasce da interação entre indivíduos conectados, e Nicholas Negroponte previu que a digitalização permitiria a personalização dos conteúdos, rompendo com a lógica da comunicação de massa. Estamos vendo isso acontecer. A linguagem radiofônica, antes cristalizada em padrões rígidos, agora se fragmenta e se reinventa em novos formatos interativos, dinâmicos e, acima de tudo, plurais.
No entanto, há aqueles que resistem. Muitos profissionais da antiga geração, acostumados a um modelo de comunicação unilateral e previsível, veem essa transformação com ceticismo ou nostalgia. Defendem a ideia de que “bom mesmo era no meu tempo”, sem perceber que essa nova era da comunicação não apenas expande as possibilidades do rádio e da TV, mas também resgata seu verdadeiro propósito: conectar pessoas, ideias e culturas.
O rádio, por muitas décadas, foi subutilizado, limitado a manchetes sensacionalistas e uma enxurrada de vozes impostas ditando verdades absolutas. Tudo isso dentro de um sistema movido a interesses políticos e comerciais, onde a audiência era passiva e o contraditório, um risco a ser evitado. A convergência midiática rompeu o monopólio da difusão de formadores de opinião, com pontos de vista tendenciosos e mal intencionados pelos velhus decrépitos de plantão.
Mas, como diria Leonardo Boff, “um ponto de vista é apenas a vista de um ponto”. E hoje, pela primeira vez, refletindo nesse viés inovador, se houver proatividade, pode-se crer que podemos ter, democraticamente falando, mais de 8 bilhões de novos pontos de vista surgindo ao mesmo tempo (viajei um pouco, mas se houver um propósito, por que não?).
O rádio, mais uma vez, não morreu – ele se multiplicou. Uma pena que muitos ainda lamentam as mudanças, ainda insistem em ficar nas portas das delegacias escrevendo suas pobres pautas, ou insistem em preencher suas grades com “uma hora só de música” (quem não tem sua própria playlist?). A nova geração já entendeu isso e jovens criadores estão escrevendo um novo capítulo da comunicação, com autenticidade, fluidez e inovação. Reinventando e utilizando com força total o que foi, por mais de um século, monopolizado e subutilizado, promovendo a descentralização dos conteúdos e a democratização das vozes que foram silenciadas.
O que vem depois? Está sendo escrito neste instante. Seguimos nessa instigante investigação.
O melhor está por vir, meus amigos radiofônicos de plantão!
Publicitário, Radialista e Doutorando em Linguística, com sólida experiência em branding sonoro, storytelling transmídia e comunicação estratégica. Especialista na criação de soluções em áudio e audiovisual para marcas, explorando o poder da voz, do som e da narrativa para engajar audiências e fortalecer posicionamentos no mercado. Professor em Publicidade, Design e Marketing, compartilho conhecimento sobre produção de conteúdo, linguagens audiovisuais, branding sonoro e inteligência midiática. Músico e Produtor Audiovisual, combino criatividade, inovação e tecnologia para criar experiências sensoriais e impulsionar a presença das marcas no universo digital. Conectando teoria e prática para formar profissionais preparados para as novas dinâmicas da comunicação. Produtor de conteúdos segmentados para rádios, TVs e plataformas digitais, com ampla experiência na estruturação de rádios customizadas para marketing e branding, além de podcasts e canais internos voltados para endomarketing e transparência corporativa. Desenvolvo soluções estratégicas para mídias eletrônicas, promovendo engajamento, fortalecimento de marca e cultura organizacional através da comunicação imersiva e personalizada. Colunista e colaborador da Revista Rádio e Negócios, além de palestrante no Tech Days, atuo na difusão de conhecimento sobre o impacto das mídias sonoras e digitais no mercado contemporâneo. Minha trajetória combina pesquisa acadêmica, inovação tecnológica e experiência prática, proporcionando insights estratégicos para marcas, empresas e instituições que buscam diferenciação e relevância no cenário digital. Know-how: Branding Sonoro | Storytelling | Estratégias de Comunicação | Rádio e Podcast | Produção Audiovisual | Mídias Digitais | Gêneros Discursivos | Transmídia | Experiências Imersivas | Neuromarketing | Inteligência Artificial aplicada ao Áudio.
Ricardo Fadul 26 de fevereiro de 2025
O Rádio, gigante da comunicação, nunca esteve ultrapassado — ele apenas muda de forma, cresce e continua presente em todas as inovações, só que raramente lhe dão o devido crédito. […]
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